ATA DA DÉCIMA QUINTA SESSÃO SOLENE DA PRIMEIRA SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA DÉCIMA TERCEIRA LEGISLATURA, EM 21-6-2001.

 


Aos vinte e um dias do mês de junho do ano dois mil e um, reuniu-se, na Paróquia Santa Clara, na Lomba do Pinheiro, a Câmara Municipal de Porto Alegre, nos termos do artigo 7º, § 1º, do Regimento. Às dezenove horas e vinte e cinco minutos, constatada a existência de quórum, o Senhor Presidente declarou abertos os trabalhos da presente Sessão, destinada à entrega do Título Honorífico de Cidadão de Porto Alegre ao Cardeal Dom Cláudio Hummes, nos termos do Projeto de Lei do Legislativo nº 034/01 (Processo nº 0983/01), de autoria da Vereadora Maristela Maffei. Compuseram a MESA: o Vereador Ervino Besson, 3º Secretário da Câmara Municipal de Porto Alegre, presidindo os trabalhos; Dom Altamiro Rossato; o Senhor Marco Maia, Secretário Estadual da Administração e representante do Senhor Governador do Estado do Rio Grande do Sul; o Senhor Eduardo Mancuso, representante do Senhor Prefeito Municipal de Porto Alegre; o Senhor Aníbal Germani, representante do Senhor Chefe de Polícia Civil; o Cardeal Dom Cláudio Hummes, Homenageado; a Vereadora Maristela Maffei, na ocasião, Secretária "ad hoc". A seguir, o Senhor Presidente convidou a todos para, em pé, ouvirem a execução do Hino Nacional, registrou as presenças, como extensão da Mesa, do Frei Irineu Costella, do Padre Vítor Hugo, representante da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil - CNBB, do Senhor Roque Steffen, representante da Secretaria Municipal de Obras e Viação - SMOV, do Irmão Avelino Madaloso, representante da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUC e, em continuidade, concedeu a palavra aos Vereadores que falariam em nome da Casa. A Vereadora Maristela Maffei, em nome das Bancadas do PDT, PFL, PSB, PMDB, PTB e PC do B, comentou aspectos alusivos à vida pessoal e à atuação religiosa e social de Dom Cláudio Hummes, justificando os motivos que levaram Sua Excelência a propor a concessão do Título Honorífico de Cidadão de Porto Alegre a Sua Eminência. Na ocasião, a Vereadora Maristela Maffei procedeu à entrega, a Dom Cláudio Hummes, de um conjunto contendo cuia, bomba e erva-mate para chimarrão e, após, foi dada continuidade às manifestações dos Senhores Vereadores. O Vereador Aldacir Oliboni, em nome da Bancada do PT, salientou a justeza da homenagem hoje prestada a Dom Cláudio Hummes, exaltando o trabalho empreendido por Sua Eminência em benefício de pessoas carentes e socialmente excluídas e destacando a importância do trabalho de evangelização realizado pelo Homenageado junto à sociedade. O Vereador João Carlos Nedel, em nome da Bancada do PPB, parabenizou Dom Cláudio Hummes pelo recebimento do Título Honorífico de Cidadão de Porto Alegre, comentando aspectos relativos à atuação de Sua Eminência como defensor da Doutrina Social Cristã da Igreja Católica Apostólica Romana e cumprimentando a Vereadora Maristela Maffei pela iniciativa da presente homenagem. Na oportunidade, o Senhor Presidente registrou o recebimento de correspondências alusivas à presente solenidade, enviadas pela Senhora Maria Luiza Jaeger, Secretária Estadual da Saúde, e pelo Senhor Cláudio Barros Silva, Procurador-Geral de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Em prosseguimento, o Senhor Presidente convidou a Vereadora Maristela Maffei e o Senhor Marco Maia a procederem à entrega do Diploma e da Medalha alusivos ao Título Honorífico de Cidadão de Porto Alegre a Dom Cláudio Hummes, concedendo a palavra ao Homenageado, que agradeceu o Título recebido. Após, o Senhor Presidente convidou os presentes para, em pé, ouvirem a execução do Hino Rio-Grandense e, nada mais havendo a tratar, agradeceu a presença de todos e declarou encerrados os trabalhos às vinte horas e trinta e quatro minutos, convocando os Senhores Vereadores para a Sessão Ordinária de amanhã, à hora regimental. Os trabalhos foram presididos pelo Vereador Ervino Besson e secretariados pela Vereadora Maristela Maffei, como Secretária "ad hoc". Do que eu, Maristela Maffei, Secretária "ad hoc", determinei fosse lavrada a presente Ata que, após distribuída em avulsos e aprovada, será assinada pela Senhora 1ª Secretária e pelo Senhor Presidente.

 

 


O SR. PRESIDENTE (Ervino Besson): Estão abertos os trabalhos da presente Sessão Solene, destinada a homenagear Sua Eminência Reverendíssima Cardeal Dom Cláudio Hummes. Convidamos para compor a Mesa Sua Eminência Reverendíssima Cardeal Dom Cláudio Hummes; Sua Excelência Reverendíssima Dom Altamiro Rossato; o Sr. Eduardo Mancuso, Secretário do Governo Municipal em exercício, representando o Prefeito Municipal de Porto Alegre; o Sr. Aníbal Germani, representante do Chefe de Polícia; o Sr. Marco Maia, Secretário Estadual da Administração, representando o Governador do Estado.

Convidamos todos os presentes para, em pé, ouvirmos o Hino Nacional.

 

(Executa-se o Hino Nacional.)

 

O SR. PRESIDENTE (Ervino Besson): Queremos registrar, como extensão da Mesa, as presenças do Frei Irineu Costella; do Padre Vitor Hugo, representante da CNBB; do Sr. Roque Steffen, representante da SMOV; do Irmão Avelino Madaloso, representante da PUC.

A Ver.ª Maristela Maffei está com a palavra e falará como proponente e pelas Bancadas do PDT, PFL, PSB, PMDB, PTB e PC do B.

 

A SRA. MARISTELA MAFFEI: Sr. Presidente e Srs. Vereadores. (Saúda os componentes da Mesa e demais presentes.) Esta é uma história de uma vida, não apenas uma vida individual, mas, bem do fundo do coração, da minha família e tenho a certeza de que de cada pessoa que aqui está.

Há quinhentos anos os franciscanos vieram para o nosso País e espalharam-se por todo este imenso Brasil. Quero destacar aqui um lugar em especial, o Seminário Seráfico São Francisco.

Nos anos 40, vários adolescentes foram convidados a iniciar uma nova caminhada como seminaristas, seguidores de São Francisco. Quero citar alguns nomes: Romano Zago, Mariani, Sérgio Dill, Mauro Bancher, Shimith, Borelli, Salvatori, Guido Maffei, Avelino Paulo Maffei, Cláudio Hummes e outros. Muitas dessas famílias, em sua grande maioria, residiam no interior do Estado.

Essa é uma história de vida de muitas lembranças e com momentos de profunda reflexão espiritual, mas também momentos de muita alegria e lazer, como por exemplo: as pescarias no arroio Caramujo; o fim da 2ª Guerra Mundial, que foi decretado feriado nacional e muito festejado por todos do Seminário.

A minha família nasceu e criou-se no interior de Lajeado, em uma pequena comunidade chamada de Campo Branco, onde os franciscanos atuavam. Frei Constantino, tenho até hoje a lembrança do meu batismo; antes de viajar para a Holanda, ele ainda me batizou.

Nos anos 70, viemos morar em Porto Alegre e no início dos anos 80 na Lomba do Pinheiro. Nessa época, a maioria das pessoas migravam do campo para a cidade, e conosco não foi diferente. Nessa comunidade, reencontramos os franciscanos e as Irmãs Aparecidas. Na Lomba do Pinheiro, no início, os Freis Arno, Nestor e Bruno eram os que estavam atuando. Reencontramos os franciscanos por meio do Frei Mário Shuc que iniciou várias comunidades. A experiência da presença divina se sentia no fundo dos olhos de uma criança e em cada ação que praticávamos. Era assim com o Frei Mário, um evangelizador que nunca se descuidou da vida espiritual, mas também nunca furtou-se de estar junto à luta do povo oprimido.

O saber tem sabor quando resulta da experiência, do sofrimento, das observações, das idas e vindas da vida. Vê-se além das aparências, não se deixa iludir por elas, capta a verdade.

Caríssimo, queria dizer a Sua Eminência, Dom Cláudio Hummes, que antes de ir tão longe, quisemos trazê-lo para esta Casa, cuidadosamente, para lembrar, de forma especial, a sua história e a caminhada dos franciscanos. E por que aqui na Lomba do Pinheiro, alguns perguntavam? Porque aqui o trabalho dos franciscanos tomou forma de um amor incondicional. Esse amor, a solidariedade com o outro, é que constitui esta grande comunidade, como uma chama que se alimenta na esperança, uma Igreja libertadora que nos ensinou que ninguém se liberta sozinho, que somos portadores de uma riqueza inesgotável, não importando o mau tempo. Essa riqueza ninguém nos tira, torna-nos guerreiros, pastores e nos deixa em comunhão.

Aqui, os migrantes, de uma época escura, foram acolhidos pelos franciscanos, e, juntos, desbravaram o desconhecido. Fundou-se comunidades eclesiásticas de base, como a Pastoral Operária. Por que aqui na Lomba do Pinheiro? Também por gratidão. Porque, por meio da Pastoral Operária, Sua Eminência ajudou a construir o meu olhar, talvez até sem saber, sobre o mundo, ajudou a compreender, a partir do mundo que eu habito, o processo da libertação.

Assim como Francisco e Clara, não importava aonde estivessem, em cada lágrima e em cada ferida aberta, abraçaram a causa dos oprimidos e dos empobrecidos.

Por que não esqueceste do amor incondicional, Dom Cláudio Hummes, da compaixão para com os sofredores e os indefesos, aquele que não se tornou apenas um contemplativo e, como Francisco, encontrou sempre ternura e vigor. Vigor no projeto pessoal de viver o Evangelho e harmonizou, em sua vida, as dimensões do mundo.

Para que não esqueças, quando estiveres longe de nós, que aqui em Porto Alegre, na Lomba do Pinheiro, nós te fizemos cidadão, porque temos orgulho da sua caminhada e o nosso coração estará sempre junto na mais simples ou na mais alta honraria que receberes.

Aqui vivem pessoas que acreditam que o útero inicial é também o útero terminal. Que Deus está no começo, no meio e no fim.

Deus, hoje, me deu, mais uma vez, uma prova de sua compaixão. Vi nos olhos do meu pai a alegria do reencontro. Não é apenas Sua Eminência que está sendo presenteado, mas também nós, a Câmara de Porto Alegre, a Cidade de Porto Alegre, a nossa comunidade, a todo o nosso País e, quiçá, o mundo.

Se me permite, Cardeal, uma parte do nosso jeito, com a nossa história e, como Francisco, despido da arrogância e de qualquer valor que pudesse transparecer querer ser mais, despido e fecundo do amor em Cristo.

Eu gostaria de, além de agradecer a presença de todos, dizer que a história dos franciscanos, a história do Cardeal Dom Cláudio Hummes e a história da minha vida, de forma e de dimensões diferentes, estão muito ligadas. Não foi por acaso que nós estamos aqui reunidos.

Hoje, eu estou Vereadora de Porto Alegre, e a prática espiritual teve muita influência na minha vida. Ainda bem, pois é o melhor que há no meu coração, o valor espiritual que foi deixado pelos franciscanos na sua caminhada. E nada mais poder-nos-ia deixar feliz a não ser este momento de reencontro, o momento de profunda espiritualidade, de profunda honra por estarmos com o Cardeal Dom Cláudio Hummes, mas de uma profunda simplicidade aqui na nossa comunidade.

Eu queria, neste momento, passar ao Dom Cláudio, só para ele não esquecer de nós, gaúchos, uma cuia, uma bomba e um pacote de erva, para, onde ele estiver, poder cevar e levar um pouco do amargo, tão doce, mas tão quente de tanto amor. Muito obrigada. (Palmas.)

(Não revisto pela oradora.)

 

(É entregue o presente.)

 

O SR. PRESIDENTE (Ervino Besson): O Ver. Aldacir Oliboni está com a palavra e falará pela Bancada do PT.

 

O SR. ALDACIR OLIBONI: Sr. Presidente e Srs. Vereadores. (Saúda os componentes da Mesa e demais presentes.) Sem dúvida, para nós, da Bancada do Partido dos Trabalhadores, é uma grande alegria podermos falar de Dom Cláudio Hummes. Não é só pelo fato de ter sido, também, perseguido e por ter lutado muito pelos nossos excluídos, mas por ter dedicado a sua vida na defesa daqueles que mais necessitam. Receba os nossos cumprimentos pela homenagem merecida e de grande valor.

Nós, homens, hoje, que temos na frente o microfone para falar para os homens e as mulheres deste País, ficamos muito preocupados, não só porque nós podemos dar, às vezes, a linha da discussão política, mas nós percebemos que, muitas vezes, a Igreja faz muito mais do que nós fizemos. Evangelizar ou ser um instrumento de evangelização dos povos, às vezes, é muito mais difícil, porque causa muita renúncia, como, por exemplo, saber fazer o voto de pobreza, castidade e obediência, como fazem os padres hoje. Eu sei, porque fui seminarista e sei o quanto é difícil nós optarmos pela vida religiosa, sabendo o que temos a enfrentar pela frente. Mas nem por isso deixamos de ser felizes, optando pela vida do leigo ou pela vida de ser sacerdote.

E é por isso que nós queremos aqui hoje, em nome da Bancada, dizer que nos orgulhamos muito, quando Porto Alegre, o Rio Grande do Sul, tem condições de oferecer um nome para poder até substituir o Papa, como é o caso aqui presente. Dom Cláudio Hummes será, sem dúvida nenhuma, a bandeira do Sul, a bandeira da América Latina para podermos ser felizes com essa grande vitória e, se Deus quiser, estamos torcendo para que isso aconteça.

Em nome da nossa Bancada, receba os nossos cumprimentos e à nossa companheira Ver.ª Maristela Maffei que teve a felicidade de propor a homenagem. Muito obrigado. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE (Ervino Besson): O Ver. João Carlos Nedel está com a palavra e falará pela Bancada do PPB.

 

O SR. JOÃO CARLOS NEDEL: Sr. Presidente e Srs. Vereadores. (Saúda os componentes da Mesa e demais presentes.) O lema episcopal de Dom Cláudio Hummes, quando sagrado Bispo - Vós Sois Todos Irmãos - permite identificar, de modo cristalino, o ideal que dá sentido a sua vida e, por isso, guia de sua ação sacerdotal.

A prática devotada desse ideal, que teve origem ainda na sua juventude e só tem feito fortalecer-se ao longo dos anos, tem marcado de forma tão grandiloqüente a trajetória deste homem, hoje, Arcebispo Metropolitano de São Paulo, que até mesmo os antagonistas de Igreja são obrigados a reconhecê-lo como justo e a conceder-lhe o mérito de que é merecedor.

A fraternidade não é uma afirmação meramente retórica, mas uma causa superior, cuja única fundamentação está na origem divina dos homens. É porque somos todos filhos de Deus, por Ele criados à sua imagem e semelhança e é porque somos amados por Ele que somos então iguais em dignidade e na destinação escatológica.

Vós Sois Todos Irmãos. Parece tão simples, tão fácil de reconhecer como verdade e tão fácil também de sentir e praticar, mas é uma verdade que só faz sentido pela fé em Deus, que só pode ser concebida no conhecimento de Deus e só se realiza na aceitação de Deus, pois, sem Deus, o homem perde a sua condição humana e passa a ser apenas um animal racional.

Abstraia-se Deus da vida dos homens e não haverá uma só razão inteligente capaz de inibir a prevalência desvairada do egoísmo sobre o fraterno, capaz de expandir a expansão incontrolável das desigualdades de toda ordem e capaz de evitar que o homem seja presa irremediável dos instintos, fera de si mesmo e dos outros, destinatário do mal, da dor e da infelicidade.

Por isso, o anúncio da fraternidade, fulcro resplandecente do episcopado de Dom Cláudio, por si só já seria bastante para justificar o título Honorífico de Cidadão de Porto Alegre, que esta Casa hoje outorga a Sua Eminência Reverendíssima, em feliz e oportuna iniciativa da ilustre e querida Ver.ª Maristela Maffei, a quem saúdo e cumprimento fraternalmente.

Acrescente-se a isso, a intensa atividade pastoral exercida por Dom Cláudio Hummes, sempre apoiado na Doutrina Social Cristã, centrada na dignidade da pessoa humana, na igualdade dos homens, na valorização dos humildes, na proteção aos mais fracos e oprimidos e na defesa da família. Essa doutrina, apanágio da Igreja Católica e tão valorizada por Dom Cláudio, é fruto do estudo e do conhecimento da realidade de cada canto do mundo, e se constitui num vigoroso instrumento de ensino e de orientação a todo mundo cristão, visando à efetiva realização do “bem comum”, tão falado, mas tão pouco conhecido.

A Doutrina Social Cristã prega o equilíbrio político e social e a eqüidistância tanto do liberalismo como do socialismo, incentivando a busca e a prática do verdadeiro caminho, exclusivamente voltado para a consecução daquele “bem comum” a que todos aspiramos, sem necessidade de apelo a doutrinas ou recursos extremados.

Some-se tudo isso e ter-se-á um caudal de motivos fortes e pertinentes a imporem o reconhecimento dos cidadãos de Porto Alegre ao esforço e ao trabalho de Dom Cláudio Hummes, este gaúcho de Montenegro, que tanto tem feito pelo povo e pela família brasileira e, por extensão, pelo povo e pela família gaúcha e porto-alegrense.

Quero agora, em nome da Bancada do Partido Progressista Brasileiro, a que tenho a honra de pertencer, juntamente com os Vereadores João Antonio Dib, Pedro Américo Leal e Alberto Moesch, cumprimentar Dom Cláudio Hummes pelo Título que está merecidamente recebendo, e pedir ao Senhor, nosso Deus e Pai, que abençoe este ato, derramando sobre Dom Cláudio Hummes toda luz de Seu espírito, para que continue a ser esse espelho de Cristo, que tão afortunadamente reflete, e a ser exemplo de vida sacerdotal, inspiradora para todas as correntes de pensamento.

Parabéns, Dom Cláudio Hummes, novo Cidadão de Porto Alegre, que Deus o ilumine sempre. Amém. Muito obrigado. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE (Ervino Besson): Queremos registrar o recebimento dos seguintes telegramas: (Lê.)

“Impossibilitada de comparecer à Sessão Solene de outorga do Título Honorífico de Cidadão de Porto Alegre ao Cardeal Dom Cláudio Hummes, face a compromissos previamente assumidos, agradeço gentil convite.

                          (a) Secretária Estadual da Saúde, Sr.ª Maria Luiza Jaeger.”;

“Impossibilitado de comparecer à Sessão Solene de outorga do Título Honorífico de Cidadão de Porto Alegre ao Cardeal Dom Cláudio Hummes, face a compromissos previamente assumidos, agradeço o convite e envio meus cumprimentos, desejando êxito no evento.

                           (a) Procurador-Geral da Justiça, Sr. Cláudio Barros Silva.”

 

Convido a Ver.ª Maristela Maffei, proponente desta Sessão, e o Sr. Marco Maia, representando o Governador do Estado, a procederem a entrega do Título Honorífico de Cidadão de Porto Alegre ao Cardeal Dom Cláudio Hummes.

 

(Procede-se à entrega do Título.) (Palmas.)

 

Passamos a palavra ao Cardeal Dom Cláudio Hummes.

 

O SR. DOM CLÁUDIO HUMMES: Sr. Presidente, Srs. Vereadores e Sr.ª Ver.ª Maristela Maffei. (Saúda os componentes da Mesa e demais presentes.) Quero saudar, de coração, a proponente da homenagem e ao seu pai, que está na origem de toda esta homenagem e, de modo muito particular, o meu irmão, Dom Altamiro, que está representando os Bispos de Porto Alegre; os meus caros confrades franciscanos, tendo à frente o Padre Provincial que também está aqui presente, Frei Nestor; os meus irmãos e irmãs de família - somos dez ainda vivos, dos quatorze que somos – com suas esposas e esposos e alguns com seus filhos e demais parentes chegados da família; meus caros colegas ex-seminaristas de Taquari, que vários foram nomeados – não vou tentar nomeá-los, porque sou capaz de esquecer alguém -, foi uma grande alegria encontrá-los hoje vários deles aqui; o representante da CNBB e do Reitor da PUC, onde também tive a oportunidade de dar aulas de filosofia; e o povo da Lomba do Pinheiro, que vieram nesta noite um pouco fria, muitos nem me conheciam e, no entanto, quiseram estar aqui presentes, isso me comove muito e fico muito emocionado, que, talvez, alguns tenham vindo com sacrifício nesta noite. Agradeço a presença de todos da Lomba do Pinheiro.

Agradecer e saudar a todos os porto-alegrenses, que, por meio da Câmara de Vereadores que os representam, decidiram me conceder o Título Honorífico de Cidadão de Porto Alegre, com o qual estou muito honrado. Já recebi muitos títulos, mas este eu prezo de modo muito especial. Maristela, você pode ter certeza que, realmente, isso faz muito parte da minha vida. Não só porque eu sou gaúcho, mas também porque a Câmara de Vereadores quis, um pouco, ligar isso a certas raízes, a certas coisas que tem a ver comigo, e conosco, que é, por exemplo, ser franciscano. Estamos aqui, na Lomba do Pinheiro, numa forma simbólica, todos poderiam perguntar, como já disse a Maristela: “Por que na Lomba do Pinheiro? E, no entanto, isso tem um simbolismo que, para mim, também é muito forte e muito estimulante por estarmos aqui.

Por ter vivido em Porto Alegre vários anos, de 1969 a 1975 - os últimos anos que vivi no Rio Grande do Sul, foram em Porto Alegre, como Professor de filosofia, como Provincial, tanto da PUC como da Faculdade de Filosofia de Viamão, e como franciscano –, eu lembro dos franciscanos quando começaram aqui na Lomba do Pinheiro há quase trinta anos. Tinha sido uma decisão muito pensada, muito refletida e assumida, de fato, como um símbolo, de que os franciscanos estavam indo para a periferia de Porto Alegre e ali queriam se dedicar aos mais pobres. Eu nunca morei aqui, mas os que moraram e trabalharam aqui sabem que, no início, não foi fácil. Estão aí, hoje, os resultados, os frutos muito bonitos e muito abundantes desse trabalho dos franciscanos, e que continua sendo um símbolo para todos nós. Por isso eu digo que, para mim, também é estimulante o fato de ter sido feita aqui, hoje, esta Sessão Solene. Isso me estimula a sempre continuar solidário com os pobres, com os excluídos, com os trabalhadores, com os desempregados.

Deus, e Jesus Cristo está aqui presente conosco, levou-me por caminhos, para mim, muitas vezes, surpreendentes. Sempre digo que Deus é muito surpreendente, Deus é sempre surpreendente. Eu nunca escolhi de vir para cá ou para lá, ou fazer isso ou aquilo, a não ser, é claro, eu optei por ser franciscano, por ser padre, isso, sim, dependia de vontade e de atos meus. Mas, depois, comecei a me orientar por aquilo que a comunidade me pedia. Sempre foi assim, eu sempre atendia àquilo que a comunidade - de uma certa forma, pelas mediações humanas, eclesiásticas, religiosas - me indicava o que eu devia assumir. Isso levou-me, de fato, por caminhos surpreendentes, pois, como provincial franciscano, lembro-me quando alguns Freis foram atrás de mim e disseram que eu deveria ser provincial. Eu caí um pouco das nuvens, porque eu era, na época, professor e ajudava a educar os nossos futuros frades franciscanos. E, na época, eu disse: “ Muitos outros podem ser provinciais, mas se a comunidade quiser, eu sacrifico outras coisas e aceito então ser.”

E assim foi a minha vida inteira. Quando eu estava terminando aqui como provincial, eu dizia que seria missionário na Amazônia, porque a Amazônia sempre me fascinou, me encantou. Esse era um desejo meu. Foi, então, que Deus resolveu me chamar para ir a Santo André, no ABC Paulista, numa selva de pedra que não tinha nada a ver com a selva Amazônica, era o inverso da selva Amazônica. E eu fui lá. Não conhecia ninguém, nunca tinha pisado lá, fui ver no dicionário onde ficava esse tal de ABC, Santo André, de cuja história não tinha nenhuma noção e fui descobrir que o ABC já tinha uma grande história. Não conhecia ninguém de lá, nem o Bispo, nenhum Padre, fui, então, nomeado Bispo de lá na sucessão do Bispo que estava terminando o seu mandato.

E a história de Santo André, de fato, me pegou. Aqui, eu era franciscano, e as questões da pobreza, da fraternidade, é claro, estavam muito dentro de nós por educação e também pela origem da minha família. Hoje, nós sabemos que éramos pobres. Na época, nós não nos considerávamos pobres, éramos todos felizes na colônia – sou filho de pequenos agricultores -, tínhamos sempre abundância de comer, mas nunca tínhamos dinheiro para nada, como todos nós, da nossa geração, sabemos como era isso naquela época. Ninguém de nós se achava pobre, hoje, quando olhamos para trás, vemos que éramos, de fato, muito pobres. Nós não tínhamos essa noção na época e, portanto, éramos muitos felizes, porque não havia o ponto de comparação. Hoje, por exemplo, descobre-se a desigualdade pela informação, ou seja, as pessoas começam a descobrir que elas estão sendo tratadas desigualmente e que isso não está certo. Para a felicidade nossa, nós não tínhamos essa noção. E hoje nós sabemos que a grande maioria dos filhos da nossa geração acabou indo para as cidades, acabaram sendo, de fato, bem sucedidos, porque haviam recebido uma educação muito empreendedora, de trabalho, de honradez, dos grandes valores familiares, religiosos. Nós saímos daquelas colônias, realmente, com uma educação básica de valores muito forte, muito grande, talvez, não tanto científica, escolar, mas de valores, que ajudaram a todos nós, depois. Isso vale para os nossos ex-seminaristas de Taquarí, que todos nós éramos coloninhos quando chegamos lá. E, no entanto, esses ex-seminaristas todos, hoje, são personalidades por aí, porque receberam uma educação a mais no Seminário, em cima daqueles valores que trouxeram da família.

A minha história tem muito a ver com isso, mas a consciência maior, a situação social e toda essa análise da sociedade, eu comecei a aprender, na prática, no ABC. Quando eu fui para lá, tomei como lema: Vós Sois Todos Irmãos. Isso, para mim, até hoje, são palavras de Jesus Cristo, tal qual ele disse no Evangelho. E alguém me perguntava: “Por que o senhor não escreveu: Nós somos todos irmãos.”? As palavras não são minhas, mas de Jesus Cristo. Essas são palavras, como dizia o Ver. João Carlos Nedel, que mudariam tudo e, por isso, é uma grande luz, porque é o próprio Jesus Cristo que nos diz isso.

No ABC, eu comecei a conhecer os operários, trabalhadores que eu não conhecia tanto de perto. Trabalhadores esses muito dinâmicos e que começaram a assumir com muita força, na época em que estavam na transição do regime militar para a redemocratização, em 1975, quando cheguei lá, estava tudo morto, ninguém falava nada, porque estava, ainda, muito fechada, e as únicas forças que haviam, reuniam-se secretamente. Naquela oportunidade, eu disse a eles que eu tinha ouvido dizer que havia uma Pastoral Operária na Diocese de Santo André e que eu gostaria de me encontrar com essas pessoas. E, então, veio um grupinho de pessoas conversar comigo, e, a partir daí, nós nos ligamos à Pastoral Operária. Vieram as grandes greves, em 1978, 1979, 1980 – muitos de vocês não eram nem nascidos ainda -, que agitaram todo o ABC e depois espalharam-se pelo Brasil afora. E eu tive a graça – porque isso foi pura graça, não era compreensão minha – de conseguir entender que a Igreja deveria se meter lá no meio, que teria que apoiar, aliás, um pouco levado pelas circunstâncias.

O interessante é que – até hoje eu digo isso – a vida de todos os dias é um pouco ambígua, a história tem ambigüidades, ou seja, quando na hora que acontecem as coisas nós temos que tomar uma decisão, nós não temos clareza sempre do que está certo ou do que não está certo. Quem está certo ou quem está errado? E, mesmo assim, temos que tomar decisões imediatas, porque, senão, nós nos omitimos. E aí, é que nós precisamos muito do Espírito Santo. Às vezes me perguntavam: “Você não tem medo dos militares?” Eu nunca me pergunto o que os militares estavam pensando ou não pensando, mas me pergunto o que é que Jesus Cristo está pensando. Essa era a minha forma de agir e dava-me uma certa simplicidade e serenidade de tomar decisões, porque, senão, fica-se um pouco preocupado do que vai acontecer. Houve, inclusive, ameaças de prisão, mas conseguimos contornar no meio da agilidade dos fatos na época.

Ali eu vi nascer o PT, a CUT, o Lula, como Líder Sindical – encontrávamos constantemente nas grandes greves -, eu participei das negociações das greves. Eu participei da Assembléia da CUT. Não participei da do PT, porque, como Partido político, a Igreja não tem de se meter nisso. E Lula me dizia: “Você está certo.” Mas na CUT, eu estive, porque era um movimento sindical e não propriamente partidário-político.

Fiquei vinte e um anos no ABC e depois fui a Fortaleza, que, para mim, foi uma outra grande surpresa. Jamais pensaria em ir a Fortaleza, no Nordeste, onde vários outros Bispos poderiam, muito bem, ter sido nomeados. Mas, para mim, Fortaleza foi uma nova escola. Fui conhecer a pobreza, a miséria do Nordeste, e, no entanto, um povo muito inteligente, muito acolhedor, muito espetacular. Eu fiquei, em Fortaleza, um ano e nove meses; fiquei vinte e um anos no ABC e vinte e um meses em Fortaleza. Foi uma experiência muito boa. Conheci a pobreza, a seca. Quando íamos para o interior do sertão, eu voltava duzentos anos atrás na história do Brasil, porque, realmente, a pobreza do povo do sertão, onde não se vê nada, só cinzas naqueles seis meses de seca, povo sem condições, nós nos dizemos: “Mas isso não é possível!” Eu fiquei até admirado que a Rede Globo, agora, está passando alguns programas sobre a fome no Nordeste. Essa, realmente, é a realidade, é o que nós encontrávamos, e, no entanto, um povo feliz muitas vezes. Dentro de toda aquela situação, um povo feliz e que não querem sair do sertão, a não ser que não tenham mais nenhuma condição. Essa é a vida deles, é a forma de como eles vivem. É um povo alegre, acolhedor, a porta está sempre aberta para quem quiser vir.

E acabei voltando para São Paulo, para a Cidade de São Paulo, encontrando todo aquele mundo de São Paulo, com a grande riqueza e a grande miséria. São Paulo que hoje é uma das grandes capitais do mundo, minha gente. Ela é uma megalópole, que não é mais simplesmente uma cidade do Terceiro Mundo, uma cidade de uma país periférico. São Paulo é uma cidade que joga junto o grande jogo do mundo. Hoje, na globalização, São Paulo – nós não vemos – é feita de muitos centros decisórios, que estão plugados, ligados com toda essa rede no mundo dos que decidem as coisas na globalização. Quem decide o mercado no mundo, são esses centros, entre os quais São Paulo faz parte, decide e discute junto. Quem decide a política no mundo, o mercado, a produção? São centros interligados, que nós não vemos, mas que estão aí fazendo parte dessa grande rede globalizada, porque isso é a globalização em primeiro lugar, ou seja, uma grande rede daqueles que tem força econômica, força de toda forma e que comandam o mundo por cima dos governos locais. Ali eu vejo o resultado de uma globalização de perfil neoliberal com colossal desemprego que isso produziu e que, portanto, é necessário de corrigir isso.

O neoliberalismo globalizado não é nenhuma solução para o mundo. O mercado não pode substituir o Estado, como não se pode optar por uma estatização. Nós sabemos que, hoje, isso não é uma solução. Nós precisamos reelaborar novas propostas. As próprias esquerdas, hoje, têm muita dificuldade teórica de elaborar os seus projetos, porque ela foi sacudida nas suas referencias teóricas.

 Nós todos estamos, de fato, diante de um momento em que é preciso estudar, buscar novamente, e é aí que entra a doutrina social da Igreja, com tudo que a Igreja pode dar. Eu sou um grande fã da doutrina social da Igreja. Ela sempre me orientou, me ajudou, e hoje, mais do que nunca, ela deve ser uma referência. Mas a Igreja gostaria de fazer isso junto com aqueles que, realmente, têm o interesse de vir ao encontro do povo mais pobre, mais sofrido, porque essa é a nossa responsabilidade, esse é o desafio que nós temos, isto é, de transformar este mundo, de fazer com que ele seja menos desigual, que não haja fome, miséria, desemprego. Por isso é que precisamos discutir com agilidade, com rapidez, porque o mundo não pode esperar muito. E é isso que nós enfrentamos em São Paulo, além do fato de que lá nós enfrentamos como Igreja a questão da ciência, da tecnologia, porque são grandes centros de pesquisas científicas e tecnológicas. São Paulo é um dos maiores centros, da América Latina, de pesquisa científica e tecnológica, e a Igreja tem de marcar presença no diálogo. Isso ela pode fazer, não mediante o seu Bispo, dos seus Padres, que não vão estar lá, e nem tem como entrar lá, mas ela tem de fazer isso através dos leigos, dando formação aos leigos.

Assim como a Maristela dizia, que foi formada aqui na base, pelos padres e acabou sendo, hoje, Vereadora esclarecida e com opções claras, e, como o Ver. João Carlos Nedel dizia que como o leigo deve, de fato, articular a sua fé com a sua vida. Os dois disseram isso muito bem, ou seja, como é preciso articular a sua fé com a sua vida política. Isso também faz os nossos intelectuais católicos, cientistas.

Esse relato mostrou um pouco daquilo que estou enfrentando, a minha vida, as surpresas da minha vida.

Quero agradecer esta acolhida fraterna, amiga, gaúcha com que hoje vocês estão me acolhendo e homenageando. Repito, fico muito honrado, muito homenageado e sinto-me mais gaúcho, mais ligado a Porto Alegre, embora tenha nascido em Batinga, que na época era Montenegro, por isso eu digo que sou montenegrino, o meu pai mora em Salvador do Sul, mas me sinto muito gaúcho e ligado a vocês todos.

Agradeço a Jesus Cristo, que foi sempre tão surpreendente comigo e a todos vocês, de modo especial à Câmara de Vereadores e à Maristela. Muito obrigado. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE (Ervino Besson): Quero saudar a todos e dizer, como Dom Cláudio Hummes falou, que, na vida de todos nós, tem uma passagem que marca, e hoje vai marcar muito a minha vida, porque, pela primeira vez, eu presido uma Sessão Solene. (Palmas.) Deus me deu a graça de vir a esta querida comunidade.

Parabéns, Vereadora, por esta belíssima iniciativa. Quero, também, saudar, de modo muito especial, em nome da Câmara Municipal, de todos os trinta e três Vereadores, as senhoras, os senhores, os jovens e as crianças demonstrando o merecimento desta homenagem, pois a Igreja, nesta noite fria, está lotada. Isso mostra o reconhecimento.

Quero agradecer ao nosso Presidente, Ver. Fernando Záchia, por ter-me dado esta oportunidade de estar aqui, junto de vocês, para presidir, pela primeira vez, esta Sessão Solene.

Convidamos todos os presentes para, em pé, ouvirmos o Hino Rio-Grandense.

 

(Executa-se o Hino Rio-Grandense.)

 

O SR. PRESIDENTE (Ervino Besson): Estão encerrados os trabalhos da presente Sessão.

 

(Encerra-se a Sessão às 20h34min.)

 

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